domingo, janeiro 28, 2007

O verdadeiro urinol

Talvez muitos ignorem que a famosa " fontaine" de Marcel Duchamp em exposição no Pompidou de Paris não é o original , mas uma cópia datada de 1964. O célebre urinol que Duchamp comprou e que expôs , convicto, no Salão de Independentes de Nova York em 1917 - e representa um dos primeiros "ready-made" da História da Arte- sumiu. Entretanto um obscuro artista de seu nome Pierre Pinoncelli, que tem uma verdadeira devoção pelo urinol exposto no Centro de Arte Moderna parisiense, decidiu a golpes de martelo chamar a atenção do mundo para um acto que considera artístico : rachou a porcelana e pintou-lhe a palavra "DADA". Foi preso é claro. Mas já em 1993 tentou intervir artisticamente dando uso à função mais prosaica do célebre urinol e ...urinou nele. O julgamento do senhor Pinoncelli- que conta a respeitável idade de 77 anos- deu num daqueles debates extraordinários, só possível de entender num país que se leva muito a sério : estamos perante um vulgar crime de dano ou pelo contrário há lugar a uma espécie de vandalismo artístico ? Pois há quem sustente que há um urinol de Duchamp e um outro Duchamp-Pinoncelli , nos termos do qual a co-autoria artística deve ser respeitada . Se bem que esta tese sustente que o vandalismo deva ser punido como tal, acrescenta que há uma outra realidade que o Direito deve proteger que consiste em tomar uma obra de arte pre-existente e com base nela fazer outra e diferente obra de arte. No limite qualquer intervenção ( destrutiva , construtiva ou adaptativa) numa obra de arte pode configurar-se como uma actuação artística e como tal sujeita a uma protecção de direito autoral. Será assim ? Tenho muitas dúvidas. Deixaria de haver lugar para a perseguição do plágio. Tolerar-se-ia o arbítrio . A paródia artística ganharia rédea solta. Mas quem sabe se o Senhor Pinoncelli não tem já o lugar garantido numa renovada ala do Pompidou, agora a festejar 20 anos ?

1 Comentários:

Blogger A.Teixeira disse...

Suponho que vou fazer um comentário que poderá ser classificado como do mais reaccionário e da menor sensibilidade artística possível, mas creio que a resposta para o problema do tratamento dado à Fonte de Duchamp poderá estar na diferença na forma como poderão ter sido considerados o ataque do Sr. Pinoncelli e o ataque que o Sr. Toth que em 1972 lhe deu para começar à martelada à Pietà de Michelangelo.

É que o Sr. Toth foi internado durante dois anos e recambiado para o seu país – é australiano. Terá sido porque os italianos não se levam a sério – ao contrário dos franceses – ou porque a arte de Michelangelo não é passível de aprimoramentos Dada? Ou as duas são válidas? Ou nenhuma delas é válida e o erro consiste apenas em chamar Arte ao mictório de Duchamp?

Bom poste, Ricardo! Pena não te aplicares mais…

10:15 da tarde  

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