sábado, abril 29, 2006

O fumo quando nasce é para todos

Só mesmo um exagero da revista Atlântico me forçaria a vir aqui. Local este que cumpre bem o papel de vazadouro de opiniões- que- também -podiam -ser- cartas- ao- director. Porque deve ser do Director da dita revista a autoria do texto. Reza assim : " A propósito da lei anti-fumo vale a pena contar um pequeno episódio .Há umas semanas a Atlântico entrou numa pequena localidade em Espanha. Parámos o carro e entrámos num café , que tinha pendurado à porta com evidente orgulho " aqui pode-se fumar". Naquele letreiro estava um apelo à resistência c0ntra os tentáculos de um poder central que tudo quer legislar e um grito de defesa da propriedade privada: " no meu estabelecimento, só eu é que decido se se pode ou não fumar". Esta lei absurda revela como o Estado -Providência se não existir sensatez, se pode transformar numa ameaça às liberdades individuais. Este excesso voluntarista parte do princípio que se o Estado se encarrega da saúde dos cidadãos então tem o direito de impor comportamentos saudáveis. Pode ser que começe aqui uma inesperada solidariedade contra a arbitrariedade do Estado. A Atlântico está neste caso inteiramente ao lado da liberdade de quem fuma". Confesso que semelhante texto provoca em mim a mesma reacção das crónicas de Miguel Sousa Tavares em "A Bola": irritação . Com a diferença que na Bola sempre possa esperar pela próxima quinta-feira e desfrutar da melhor cronista de toda imprensa portuguesa : Leonor Pinhão. Não acontece o mesmo na Atlântico que não tem nenhuma Leonor Pinhão das ideias . A imagem é pobrezinha e está batida mas vem sempre a jeito : é água a mais na Atlântico . Então a Atlântico acha , ingenuamente, que o tal cafezinho pendurou não sei o quê na porta em defesa da propriedade privada ? E que o modesto taberneiro espanhol qual David contra Golias lança um apelo à resistência contra os tentáculos do poder central ? E que na linha da frente pelas liberdades individuais contra o Estado-providência se perfila com "orgulho" esse Quixote fronteiriço representante de todas as "bodegas" ibéricas ? A Atlântico delira certamente. O acto singelo de pendurar um letreiro na porta a dizer aos viajantes " aqui pode-se fumar" não tem nada de heróico e é a comezinha tradução das preocupações de todos os estalajadeiros que têm que pagar renda e salários: mais clientes, mais negócio. E nisto vai um verdadeiro Atlântico de distância entre o início de uma vibrante campanha contra a lei anti-tabaco , a que a revista galhardamente se põe ao lado e a simples mas justificada preocupação com as contas ao fim do mês. Onde a Atlântico vê nobres ideais afinal só há esperteza saloia e capitalismo elementar de quem tem de manter o café aberto e ganhar a vida . Patético, reconheça-se. Imaginamos o nosso Manolo se por acaso lhe for parar às mãos este número da revista Atlântico, agarrado à barriga de tanto rir: então aquela rapaziada portuguesa que veio cá beber um café e até deixaram gorgeta acha que eu sou contra o "Estado providência" e mais não sei quê tentacular ? Sou isso tudo e mais o que eles quiserem " si si no me quitan la tienda" e deixarem uns trocos! É claro que estes excessos atlânticos caem no ridículo e contribuem até para debilitar alguma argumentação minimamente consistente contra a lei anti-tabaco. Mas se alinharmos a discussão por uma via menos cómica há que dizer duas ou três coisas. A Atlântico acha que a lei anti- tabaco é uma arbitrariedade do Estado e que a liberdade de quem fuma está em causa. Eu acho que a questão também está na liberdade de quem não fuma. E é ante a ponderação das duas liberdades que o Estado tem de agir. Mas ao fazê-lo deve escolher a parte mais fraca, que é justamente a de quem não fuma . A Atlântico acha que o Estado não tem que impor comportamentos saudáveis às pessoas e que na casa de cada um ( ainda que a tenha aberta ao público) o proprietário faz o que quer. O argumento tem barbas e está cansado. A Atlântico sabe bem que a propriedade privada e a liberdade individual não garantem tudo ( nem vale a pena aduzir aqui alguns exemplos que sempre pecariam por excessivos) , designadamente essa ideia peregrina de que tudo se pode fazer no uso desses direitos . Nem o direito à privacidade é absoluto quanto mais o direito de propriedade . A questão da lei anti-tabaco não é só um problema de saúde privada e liberdade individual . É um problema de saúde pública e é um tema a resolver em sede de conflitos de direitos. Mas a Atlântico não quer ir por aí . A sua bela e cómica campanha está já montada : Viva a desobediência à lei ! Viva o direito de resistência ! O fumo quando nasce é para todos !

quinta-feira, abril 20, 2006

Gente como nós

Por sugestão de uma amiga tropeço nesta série da BBC já com alguns anos ( 1996 ? ) . São 12 episódios hilariantes ( embora isto do humor tenha muito que se lhe diga) . Aliás, para quem é incondicional do "The Office" e desse verdadeiro louco chamado Rick Gervais, percebe que muito da encenação , do estilo, do argumento , do modo como a câmara se movimenta já estava presente em " Gente como nós". Cinco estrelas.

sábado, abril 15, 2006

Ségolène (II)

Vale a pena espreitar o site www.desirsdavenir.org e o blog www.segolene2007.canalblog.com de Ségolène. A rapaziada do PS françês( Lang, Kahn, Fabius, Jospin) que se cuide...

Internet social

O Público de hoje traz uma excelente reportagem sobre a "internet social". Nunca tal tinha ouvido falar. E ainda menos do "myspace" e do "Hi5".Mas o jornal aconselha: pergunte aos seus filhos. Foi o que fiz. E fiquei mais ou menos esclarecido. É assim uma espécie de sistema de blogs, mais fácil , arejado e sobretudo com menos anonimato ( que é uma coisa bizarra que aqui pegou de estaca ) . A ideia é boa e o enquadramento é feliz. Contrariando as aves agoirentas que vêem em tudo o que é novo o começo do apocalipse, a reportagem do Público é muito positiva: as pessoas querem comunicar e cooperar umas com as outras. O mundo real e o virtual sobrepõe-se. Este novo espaço de socialização global tem os seus riscos e os seus pontos negativos, como tudo e como antigamente .... Mas também temos novas ferramentas para os evitar . Estamos a mudar o mundo para melhor, espero eu . E não é apenas um piedoso voto pascal .

sexta-feira, abril 14, 2006

Sociologia caseira

"Na educação do ser humano justifica-se uma correcção moderada que pode incluir alguns castigos corporais ou outros", Acórdão do STJ sobre o caso da Associação de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental de Setúbal. O relator que elaborou este texto e os seus colegas juizes que assinaram por baixo são um verdadeiro caso mental. É claro que eles não ignoram a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Crianças. E também não ignoram que como todas as Convenções ratificadas por Portugal aquela faz parte integrante do nosso direito devendo ser respeitada pelos nossos tribunais . Então como explicar a aberração ? Justamente porque os juizes se julgam acima da lei fazendo das decisões judiciais pequeninas teses de sociologia caseira. Com resultados catastróficos...

terça-feira, abril 11, 2006

Couves e Alforrecas

Lê-se em 30 minutos mas vale bem a pena. O livro de João Pedro George sobre a escrita de Margarida Rebelo Pinto ( cujo texto ao que parece esteve disponível no seu blog http://www.esplanar.blogspot.com ) deixa a senhora em sangue. Mas acaba por ter um efeito perverso: de tão caricato quase apetece ler Margarida Rebelo Pinto.

Higiene

O afastamento de Berlusconi da política italiana e europeia é uma questão de higiene. Prodi não será o sétimo céu, mas é seguramente mais decente que esse pantomineiro que (des) governou a Itália durante cinco anos.

domingo, abril 09, 2006

Sophia e a Grécia

"Vim de Brindisi a Patras ; mar azul , céu azul, ilhas azuis, golfinhos ao longo do navio. Entre Patras e Corinto, ao longo das montanhas e do mar, no mar perfumado de fruta e resina entre oliveiras e loureiros a mais bela paisagem que já vi. Depois foi a solenidade indizível da Acrópole, grandeza esmagadora quando lá fui pela primeira vez sozinha no sol do meio-dia e pensando nos meus amigos distantes e presentes" (Carta de Sophia a Jorge de Sena , 14/9/63)
" Não tento descrever-lhe a Grécia nem tento dizer-lhe o que foi ali a minha felicidade total. Foi como se eu me despedisse de todos os meus desencontros, todas as minhas feridas e acordasse no primeiro dia da criação num lugar desde sempre pressentido. (...) Sob o sol a pique, numa claridade azul indescritível o ar é tao leve que nos torna alados e o menor som se recorta com inteira nitidez. As enormes e constantes montanhas povoam tudo de solenidade. Cheira a resina e a mel e há uma embriagez austera e lúcida(...) Gostaria de lhe contar tudo o que vi, desde o sabor espantoso do vinho com resina que me entonteceu logo na primeira noite da minha chegada até a água gelada que bebi num dia de calor intenso nas montanhas de Delfos. Mas sinto que só sei falar mal disto tudo.
Aqui minha fala se quebra como a quem
Viu em sua frente um deus visível
E vai sem imaginação, perdidas as palavras
No real indicível"
"(...) Será possível que eu lá volte? Assim espero . E de todo o coração desejo que voçê um dia lá possa ir. Pois o que ali há além de tudo o mais, é uma intensa felicidade de existir que nos lava de tantas feridas" ( carta de Sophia a Jorge de Sena , Maio de 1964)

sábado, abril 08, 2006

Ségolène

Aí está a solução estética para a França. Que bem precisa...

sexta-feira, abril 07, 2006

A voar

Pelo menos até amanhã. O I FLAE ( Festival Lusíada de Artes do Espectáculo) encerra amanhã à noite no Auditório Orlando Ribeiro em Telheiras com a peça " Alguém terá de morrer " de Luiz Francisco Rebelo representada pelo GTUL ( Grupo de Teatro da Universidade Lusíada) . Má notícia para quem quiser ainda ver : já não há bilhetes. Esgotadíssimo. Acrescente-se que durante toda a semana as audiências às representações do Cenatório ( Lusíada Porto) , do ISCTE, da Nova, da UBI , de Évora bateram todas as expectativas. E meteram o FATAL no bolso.... Teatro académico meus senhores, com muita gente a ver e a gostar. Para o ano há mais.

Lógica

O Barcelona foi melhor. Tem melhores jogadores. Alguns são mesmos os melhores do mundo. E um génio da bola, chamado Ronaldinho . Mas a verdade é que se o Simão tem marcado aquela bola aos 61 minutos éramos nós que estávamos nas meias, disso não duvido . A lógica é mesmo uma batata e o futebol um batatal...

Grandeza

Então é assim ( como agora se diz) : metade dos portugueses são do Benfica e a outra metade são anti-Benfica ( disfarçados de lagartos , andrades e quejandos ) . Por aqui se vê a grandeza da Águia.

domingo, abril 02, 2006

I fly . E tu ?

Toda esta semana , por iniciativa do Grupo de Teatro da Universidade Lusíada de Lisboa ( GTUL) aí está o I Festival Lusíada de Artes do Espectáculo ( I FLAE) . Grupos de todas as Universidades do País ( ISTCE, Nova, Évora, UBI) mais os dois grupos da Lusíada ( GTUL e Cenatório , da Lusíada do Porto) vão animar as noites ( 21 h) ali em Telheiras no Auditório da Biblioteca Orlando Ribeiro. Todas as tarde nos jardins do "campus" da Lusíada de Lisboa, espectáculos gratuitos para toda a gente : comedia del arte, teatro chinês, "stand up comedy", etc . Quem disse que os estudantes não se interessam pelas artes do espectáculo ? I fly . E tu ?

Sylvia Plath

A excelente interpretação de Gwyneth Paltrow em "Sylvia" ( além do mais muito parecida fisicamente ) deu a conhecer ao público português a vida de Sylvia Plath ( 1932-1963) . Mas o filme vive sobretudo da relação conjugal com o escritor Ted Hughes e, na parte final, do melodramático suicídio de Sylvia . Mas esconde a verdadeira natureza desta mulher tão inteligente e bonita quanto estranha e desesperada. E do seu destino. Existem algumas traduções portuguesas da poesia ( e da prosa) de Sylvia. É nessa poesia- forte, dilacerante, violenta mesmo- que o destino de Sylvia se traça . Como neste poema : " Morrer/ É uma arte , como outra coisa qualquer./ E eu executo-a excepcionalmente bem./Executo-a de forma parecer-se com o inferno/ Executo-a de forma a parecer real/Acho que se podia dizer que tenho um dom. / É bastante fácil executá-la numa cela/ É bastante fácil executá-la e ficar como se nada fosse./É cena de teatro". " Ou neste outro : " For the eyeing of my scars, there is a charge/ For the hearing of my heart- / It really goes/."

sábado, abril 01, 2006

33,3%

A nova lei ( ainda em projecto) prentende reservar às mulheres uma representação na vida política ( deputadas sobretudo) calculada em um terço . Para quê ? Não valia uma só Natália Correia por todas as poucas mulheres e muitos homens que lá andavam ? " Já que o coito- diz Morgado/ Tem como fim cristalino/ Preciso e imaculado/ Fazer menino ou menina/ E cada vez que o varão/ Sexual petisco manduca/ Temos na procriação/ Prova que houve truca-truca/ Sendo pai de um só rebento/ Lógica é a conclusão/ De que o viril instrumento/ Só usou-parca ração!-/ Uma vez. E se a função/ faz o órgão-diz o ditado-/ Consumada essa a operação/ Ficou capado o Morgado"